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O Amor Pode Morar Onde Você Quiser - Anderson Lima

Por: Anderson Lima Em: 10/03/2017

De forma muito especial compartilho com vocês, meus amigos, este trecho do poema "O pastor amoroso" de Fernando Pessoa: "O amor é uma companhia. Já não sei andar só pelos caminhos, Porque já não posso andar só. Um pensamento visível faz-me andar mais depressa. E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo[...]".

Interessante, na sociedade dos números, hipermoderna e consumista em que sobrevivemos falar de amor é algo que parece ser antiquado. Afinal, onde está o amor? No Google existe mais de duzentos milhões de resultados para essa busca, e mesmo assim há um grande vazio em todos nós. Você já parou para pensar, será que hoje o amor é mais real do que virtual?

Carlos Drummond de Andrade, em sua obra: "Claro enigma" diz que todos nós temos a capacidade e o desejo de amar e de sermos amados: "Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? Amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar? Sempre, e até de olhos vidrados, amar?" O que me faz gostar de poesia é a capacidade do poeta exprimir o que sinto, ele fala o que meu silêncio não me permite dizer, ele chora o que meu orgulho impede de externar. O poeta tem acesso ao meu coração, nas palavras dele o meu sentir solitário é exposto.

Se pararmos para refletir, veremos que estamos cada vez mais conectados, interligados, juntos, on-line, mas sempre falta aquele algo mais. Talvez seja o frio na barriga, um abraço, um beijo ou um simples estar junto. Onde mora o amor? Na sua "Storie" no Instagram ou na presença de pessoas agradáveis? No seu status ou em um passeio com os amigos? Em alguém que curtiu a sua foto ou em quem lhe deu um presente? Os Beatles tinham razão quando cantaram: "Al you need is love! " Tudo de que você precisa é amar! O amor é a energia que existe em nós, como a força de uma semente que se transforma em flores e frutos. Queremos sempre um amor de novela, mas não qualquer amor e sim aquele que nada pode impedir um final feliz, nem mesmo uma internet lenta ou uma conexão perdida.

Em virtude disso, na atualização frenética das redes sociais esse amor parece possível, todos estão sempre atualizando seus sentimentos, suas alegrias e suas paixões, mas nunca seus dissabores. E assim como nós pessoas reais também sentem um grande vazio. Uma saudade que não se resolve com uma nova mensagem no "Messenger". Será que não está na hora de bloquearmos esse tipo de amor virtual, e persistir no amor que seja verdadeiro, off-line e real? A flor pode ser uma confissão de amor se ofertada a alguém que amamos ou pode ter um significado de saudade se posta sobre uma sepultura. Tudo depende do significado que damos às coisas e às pessoas.

Até pra quem não conhece nada de música, consegue perceber quando o solo musical não está harmonioso, quando a nota não encaixa na voz, quando o tempo está inadequado com a melodia, mas todos esses fatores externos e auditivos tornam-se secundários quando o coração tem sua capacidade de acolhimento e de amar ativa. Quando corações deixam de se comunicar e entender ficam presos a coisas mesquinhas, em avaliações que só levam ao distanciamento. Ao invés de nos conectar à internet, por que não compor uma nova canção, a melodia do amor? Onde a pauta com cifras e partituras sejam decididas por nós e não pelos dispositivos digitais e seus softwares que nos sufocam, pois o amor é o melhor fármaco da alma.

Será que amor não rima com liberdade? A poesia tem a capacidade de significar algo, e significar é fazer valer existencialmente. O mundo virtual está cada vez mais sufocante, precisamos respirar, tomar um ar, desconectar, experimentar. E como nossa atualidade é marcada pelo verniz, pela superficialidade, pelo fugaz, conhecemos hoje e descartamos amanhã. Amo e brinco, amo e magoo, amo e não tenho responsabilidade, amo e não sou honesto, amo e tenho atitudes que ridicularizam. Amo ou amo-me? Concordo com os rockeiros do Jota Quest quando cantam: “O amor é o calor que aquece a alma, o amor tem sabor pra quem bebe a sua água.”

Um bipe de WhatsApp não deveria nos provocar mais emoção que um abraço, não dá pra amar ou descrever o amor com 140 caracteres sugeridos pelo Twitter. Precisamos seguir com que nos faz feliz, não com o que nos torna vazios e solitários. Por enquanto, o que sabemos é que o amor só existe quando está conectado e compartilhado a partir de corações que se cruzam e que se permitem conhecer a fascinante experiência que é amar. O amor pode morar onde você quiser.

Na canção do amor, têm dois compositores, eles têm que encontrar harmonia, têm que se perdoar, têm que falar francamente, contar de tudo e tudo, têm que ter certa cumplicidade, ousadia e uma boa dose de criatividade. Concluo, portanto, com Caio Fernando Abreu que amando tornou-se poeta: “Sem platonismos, nem zen-budismos: quero que pinte o amor-bethânia, dançar de rosto colado, pegar na mão, à meia-luz, desenhar com a ponta dos dedos cada um dos teus traços, ficar de olho molhado só de te ver, de repente..." O que mais importa pra mim hoje é morar onde mora o amor, pois ele já imprimiu objetivamente em meu coração a maior nota poética que é amar.

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